“… pelo depoimento de duas ou três testemunhas,
se estabelecerá o fato.”
Deuteronômio 19.14
A Bíblia define a necessidade de pelo menos duas testemunhas para se estabelecer a verdade sobre alguma disputa. Esse princípio nos autoriza a desconfiar de qualquer teologia baseada em revelação ou descoberta de apenas uma pessoa. Essa lei nos poupa tempo e nos ajuda a desviar de ensinos heréticos.
Entretanto, certos ensinos de Paulo destoam de todos os outros ensinos contidos tanto no Antigo como no Novo Testamento.
Existem inúmeros exemplos de lobos solitários que enganam a muitos e causam grande destruição. Jim Jones é um clássico exemplo de tais lobos, mas existem muitos outros membros menos óbvios dessa matilha.
Um dos traços que se repetem na vida de muitos hereges é a solidão. Geralmente eles se distanciam das lideranças e passam por um período de isolamento.
No livro de Gálatas Paulo declara ter passado 3 anos longe do convívio com os outros Apóstolos e discípulos: parti para as regiões da Arábia e voltei, outra vez, para Damasco. Decorridos três anos, então, subi a Jerusalém.
Pode-se especular sobre esse período longe da comunidade de Jerusalém. Teria Paulo, durante esse tempo separado do centro de Judaísmo Nazareno, formulado os conceitos da nova religião que estava para surgir?
Os seguidores de Paulo alegam que durante esse período ele teria recebido de Deus “a visão sobre a nova religião gentílica”. Acontece que, “revelações” recebidas através de experiências místicas individuais e que contenham idéias e princípios que não podem ser confirmados em outros textos bíblicos são suspeitas devem ser avaliadas com cautela.
Por outro lado, não podemos discartar certos discursos brilhantes de Paulo que são totalmente coerentes com o resto da bíblia.
Diante disso, muitos entendem que são aceitáveis os ensinos de Paulo que estiverem em concordância com Moisés e os Profetas. Por outro lado, os escritos atribuídos a Paulo que parecem conflitar com a Torah, devem ser rejeitados. Simples assim.
Além disso, existem dúvidas sobre a sua autoria de algumas cartas atribuídas a Paulo. O Novo Testamento só foi canonizado muito longe de Jerusalém e muito tempo após o declínio dos Nazarenos.
Foi no norte da África que, em 393, durante o concílio de Hipona, e, posteriormente em 397, no Concílio de Cartago, que um grupo de gentios sem conhecimento de hebraico, sem contato com a cultura judaica, decidiram quais seriam os livros oficiais a serem aceitos.
Um dos líderes presentes no concílio de Hipona foi Agostinho. Os estudiosos concordam que Agostinho e sua família pertenciam a um grupo indígena do Norte da África que falava latim. Ele era fortemente romanizado.
Teria Agostinho juntamente com outros líderes gentios preservado os textos de Paulo sem adulterações? Teriam sido capazes de traduzi-lo e, ou, interpretá-lo?
Uma vez que somente as cartas de Paulo parecem conflitar com a fé original, e, uma vez que ele é o único a fazer isso, sua teologia não tem a força que parece. Uma boa teologia deve ser respaldada por mais de um autor, deve ser confirmada pela Torah e pelos profetas. Paulo está sozinho.
No Novo Testamento ele é único a se defender uma religião gentílica, é o único a pregar que a lei teria sido superada. Paulo está na contramão de Yeshua, na contramão de todos os demais discípulos e de todos os profetas.
Em Colossenses temos a seguinte declaração de Paulo:
“…tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós,
e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz.”
Colossenses 2.13 e 14
Segundo Paulo, ou melhor, segundo a leitura que se faz das palavras de Paulo acima citadas, a lei foi cancelada na cruz.
Se a lei foi realmente cancelada e os mandamentos escritos na Torah e nos profetas tivessesm perdido a validade, como explicar que em Apocalipse, esses mesmos mandamentos são citados lado a lado com a fé em Yeshua? Vejamos:
E o dragão irou-se contra a mulher e foi fazer guerra com o restante da sua descendência,
os que guardam os mandamentos de Deus
e têm o testemunho de Jesus Cristo.
Apocalipse 12:17
De acordo com Apocalipse, os que guardam os mandamentos de Deus e tem o testemunho de Yeshua fazem parte de um mesmo grupo. Não existe conflito entre a Torah e a fé no messias.
Paulo é o único a discursar sobre algo nunca imaginado: uma religião gentílica que crê em Yeshua mas que não obedece às leis por ele estabelecida. Ora, conforme a própria bíblia, é necessário mais de uma testemunha para se definir a verdade em uma disputa. Se a religião de Paulo está certa, o resto das escrituras deveriam confirmar seus ensinos. Mas isso não acontece.
Se Yeshua intencionasse criar uma nova religião, separada do Judaísmo e realmente estivesse validando a religião da incircuncisão, do domingo e da carne de porco, porque ele não mencionou esses assuntos em seus ensinos?
É importante compreendermos que, na bíblia, não existe o que conhecemos hoje como Cristianismo.
O Novo Testamento é um livro de Judaísmo que endossa práticas e tradições judaicas. Se um discípulo de Yeshua pudesse ser transportado no tempo para nossos dias, ele não reconheceria no cristianismo aquilo que ele aprendeu de Yeshua.
O cristianismo, raptou conceitos judaicos e os deformou: de forma a ficarem irreconhecíveis. Vejamos alguns exemplos:
O termo Levitas, é hoje usado em várias organizações religiosas como se fosse o sinônimo de: grupo de louvor.
A palavra Igreja, que na sua concepção original é um termo judaico usado para se referir a congregação dos filhos de Israel, passou a ser entendido como algo pertinente ao cristianismo.
A palavra evangelho, que também vem do judaísmo, perdeu o significado original.
A palavra Apóstolo, é outro termo judaico. Apóstolo/ἀπόστολοσ vem do verbo ἀποστήλλειν que quer dizer enviar. Em hebraico, o termo apóstolo é שָׁלִיחַ / shaliar significa enviado.
Segundo Theod. Reinach, em Textos Grecs et Romains
o termo, Apostoloi, era o nome oficial dado aos homens enviados pelos governantes de Jerusalém.
O Historiador Eusébio (260 – 339d.C.) declara :
“Ainda é um costume entre os judeus chamar aqueles que carregam cartas circulares de seus governantes pelo nome de apóstolos / shilirim / שְּׁלִיחִים“
Epifânio (320 – 403d.C.) declara:
“Os chamados apostoloi estão logo abaixo dos patriarcas, com quem eles se sentam no Sinédrio, decidindo com eles questões da Lei.“
O que conhecemos hoje em dia como Batismo, é, na verdade, uma prática judaica: o tevilah, ou seja, a imersão.
A maioria desconhece a judaicidade do Novo Testamento pois o processo de adulteração conceitual é uma prática tão difundida e consolidada dentro da nova religião que surgiu, que o judaísmo original se tornou irreconhecível.
O ápice da deformação conceitual foi transformar em pecado a prática do judaísmo. A enciclopédia Britânica afirma que Paulo prega contra os judaizantes. De acordo com essa tese, judaizantes seriam os “cristãos gentios que se apaixonaram pelos costumes judaicos e defenderam a lei cerimonial judaica para os cristãos gentios.”
A enciclopédia Britânica erra em dois pontos: primeiro imagina existirem cristãos em uma época em que, cristãos, como conhecemos hoje, não existiam. Em segundo lugar, julga ser errado defender a lei judaica. Ora, se defender a lei judaica fosse pecado, então Yeshua e todos os demais profetas teriam pecado.
“Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, este é o que me ama; e aquele que me ama será amado de meu Pai, e eu o amarei e me manifestarei a ele.” João 14.21
“A lei do Senhor é perfeita e restaura a alma.” Salmo 19.7a
“Aqui está a paciência dos santos; aqui estão os que guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus.” Apocalipse 14.12
Não nos deixemos constranger por um pregador que, sozinho, tenta se impor. É hora imitarmos alguém que é maior que Paulo: Yeshua.
Aquele que diz: Eu conheço-o e não guarda os seus mandamentos é mentiroso, e nele não está a verdade.
I João 2.4
Silvia Mazoni